Hoje falava
para os meus alunos sobre o prazer que tenho tido ao ler Wittgenstein. Não
porque concordasse com ele, mas porque ele, mesmo muito jovem, ousava pensar
por si mesmo. Os últimos meses têm sido especiais. Estou lendo textos pouco
lidos desse grande pensador austríaco. Tenho lido seu diário, escrito entre
1914 e o início de 1917, assim como as conversas que teve com o famoso filósofo
da ciência Moritz Schlick e que foram transcritas pelo discípulo deste, Friedrich
Waismann, lá no final da década de 20. Há uma grande distância filosófica entre
esses textos. Uma mudança profunda.
sábado, 14 de julho de 2018
Wittgenstein e meus jovens alunos
Quem sabe procurar,
encontra filosofia mais perto do que imaginaria
Agostinho, o erro e o ser
Quem tem medo de
errar, nunca chegará a ser.
Não
dediquei aos filósofos medievais o tempo que gostaria, e o que eles,
certamente, merecem. Ainda continua sendo um projeto futuro — o de dedicar-lhes
mais tempo, isto é. De outro lado, tampouco os negligenciei por completo. Eles
foram bons companheiros de caminhada em alguns momentos da minha vida e volta e
meia me ocupo de seus argumentos — com enorme prazer, devo reconhecer. Começou
essa amizade nos tempos de graduação.
Os tempos e seus filósofos
Nos tempos do
capitalismo mesquinho e global, até os filósofos se escondem no especialismo
Hegel dizia
que o filósofo é filho de sua época, e que ele não pode escapar a ela assim
como ninguém pode sair da sua própria pele. De alguma maneira, os tempos, as
épocas, têm seus correspondentes filósofos. O que pode soar esquisito. Em que
sentido o tempo pode produzir pessoas que lhe correspondam. A crise gerada pela
perplexidade que provocou o aparecimento das geometrias não euclidianas, por
exemplo, produziu um determinado tipo de trabalho filosófico: o de fundamentar
a geometria e, em geral, as matemáticas. Essa crise gera, poderíamos dizer, o
fundamentalismo lógico-matemático e seus representantes, Frege e Russell, o que,
por sua vez, leva ao fundamentalismo semântico do Wittgenstein e dos membros do
Círculo de Viena, no início do século XX. A crise entre os Estados Unidos e a
União Soviética, no início dos anos 60, não é mais que um aspecto de uma luta
que ocorria em várias frentes. E os filósofos, naturalmente, não escaparam
dela. O trabalho do filósofo francês, nascido na Argélia, um 16 de outubro de
1918, está, como poucos, inserido nessa luta em que o mundo todo estava, de uma
ou de outra maneira, envolvido.
quinta-feira, 5 de julho de 2018
Como produzir um texto
Como produzir um texto
Não é possível
produzir filósofos, eles se inventam sozinhos
Um
aluno me pára no corredor e me conta que está com problemas na minha matéria.
Quer que eu diga como produzir um texto. Trata-se de um aluno de uma disciplina
que inventei, sobre a qual já falei e
que num artigo anterior descrevi como antiacadêmica. O prefixo “anti” não
necessariamente significa “contra”, pode ser usado como “em lugar de”. Assim,
em lugar de uma disciplina em que iria discutir as teses dos grandes filósofos
ou filósofas, decidi discutir com
quem, sinceramente, considero futuros filósofos e filósofas. Proponho problemas
(sobre arte, sobre valor) e levo os estudantes a se posicionarem sobre as
dificuldades que aparecem, motivando-os para que escrevam, produzam textos
próprios que preparam durante a semana e que me entregam antes de cada sessão. Eu leio os
textos em sala de aula e debatemos os — sempre diversos — enfoques, suas
implicações, desenvolvimentos, problemas etc. Tenho recebido textos, sem
exageros, primorosos. Tanto pela forma como pelo conteúdo. Mas, compreendo, num
meio em que o aluno é preparado quase que exclusivamente para repetir — se não,
simplesmente, recitar — as idéias dos grandes filósofos, fazer o oposto resulta
muito difícil. Em que sentido ‘fazer o oposto’? No sentido de se assumir como
filósofo, como pensador, como escritor, como produtor de idéias. De se saber
capaz de reconhecer problemas e se debruçar para, pelos próprios meios, tentar
resolvê-los. (Saber-se capaz de resolvê-los sem o recurso ao clássico, ao texto
consagrado, ao filósofo insuperável e a tudo o que a tradição e a academia impõem
como sacrossanto.)
Por que produzir um texto
Um texto filosófico é
a exteriorização de uma preocupação autenticamente nossa
Já
mantive a tese de que se começa a filosofar motivado por algum problema. E, por
outro lado, defendi também que se faz filosofia de inúmeras maneiras. Penso que
a segunda afirmação é correta e, mais do que isso, irrefutável. Basta só olhar
a própria história da filosofia. Mas essa segunda tese, correta, não me parece
mais compatível com a primeira. Logo, a primeira deve ser reformulada. Assim como
se faz filosofia de inúmeras maneiras pode-se começar a filosofar por incontáveis
razões. Pode ser um problema, mas pode ser por passarmos a ter um olhar
diferente sobre as coisas, mesmo sem saber exatamente por que, ou sermos
levados por alguma intuição, ou por uma idéia que surge de repente.
Essas
inúmeras vias que nos levam a filosofar são os tantos caminhos que nos obrigam
a refletir, a querer entender, a procurar respostas, a clarear nosso panorama
sobre as coisas — sobre os mais diversos assuntos. Por isso, o texto, num
sentido, já está escrito na nossa mente antes de pôr as idéias no papel. Não se
começa a escrever porque sim. A escrita é uma conseqüência de um estado
reflexivo anterior. Ela pode ser o meio, apenas, de esclarecer e ordenar nossas
idéias, de ver aonde nos levam nossas intuições, de percorrer os caminhos que
se abrem e que nos conduzem a lugares desconhecidos.
Para que escrever um texto
Escrever, como compor ou pintar, talvez seja o único meio para escapar
da nossa sanidade
Talvez
seja necessário olhar de outros ângulos a questão do por que e como escrever um
texto. Quiçá a pergunta inicial deva ser ‘para que escrever um texto’. Provavelmente
deveria ter começado por ela. Mas a pergunta que me foi feita (“como escrever
um texto”) pressupunha um contexto específico que explicava implicitamente o
‘para que’. Na academia o ‘para que’ se subentende. Sabemos que tudo se faz, em
última instância, para aprovar os cursos.
Mas,
e se fosse para outra coisa, para que seria? Talvez esse outro ‘para que’ seja
mais importante. O que me obriga a escrever aqui uma espécie de antidiscurso,
um antiartigo. Quem não pode deixar de pensar e ver as coisas de outros ângulos
dificilmente entenderá que um texto deva ser escrito para se aprovar cursos.
Saiamos da academia um pouco. Pois dentro ou fora dela há um outro ‘para quê?’,
um tão importante quanto outros porquês.
quarta-feira, 4 de julho de 2018
Sobre o suicídio
Suicídio é a pena
perpétua que condena inocentes
Poucas
vezes pensamos no poder que as palavras realmente têm, especialmente quando
refletimos sobre o poder que poderiam ter tido. Somos forçados a pensar em
certos assuntos pela força das circunstâncias, e mesmo quando temos o hábito de
refletir, dificilmente o fazemos sobre o suicídio. Há assuntos sobre os que, em
geral, não pensamos. Não é raro, no entanto, pensar sobre a própria morte. Já
devemos ter sido levados a isso por várias razões. Quando adoecemos, quando
escapamos de um acidente que poderia ter sido fatal. Na infância e na
adolescência não é raro ter esse tipo de experiências, particularmente se, como
crianças normais, há amigos para com eles se aventurar por lugares perigosos,
aqueles que não podem deixar de ser visitados, sejam florestas, rios, montanhas
escarpadas, cavernas e tantas outras coisas. A morte de alguém próximo, também,
é motivo para pensarmos mais detidamente sobre a morte, em geral, e nossa
própria morte, em particular. A morte natural de familiares me impressionou
desde criança. Tenho a sorte de não ter tido parentes próximos, amigos íntimos,
mortos em acidentes ou pela própria mão. Mas, de um tempo a esta parte,
ocorreram alguns episódios em que pessoas que conhecia melhor decidiram se
matar.
Tributo a Ogner Schaiblich
O dia em que as drogas
venceram a inteligência
Em
várias oportunidades tenho manifestado minha alegria por ver como o nível dos
estudantes que entram no curso de filosofia melhora a cada ano. Além de virem
dos seus colégios melhor preparados, entram cheios de esperanças. Muitos sonhos
e poucos vícios. É o caso da maioria deles. Poucos vícios, em todos os
sentidos. Pois há os vícios acadêmicos, mas há também os outros.
O
ano que termina poderia ter sido um daqueles em que o balanço final é positivo,
e altamente estimulante. Para mim, particularmente, por ter oferecido dois
cursos, um em cada semestre, que foram sugestões de alunos. Destaca-se o
primeiro, um curso de Filosofia da Arte em que os alunos tinham de escrever
textos, originais, defendendo fundamentalmente suas próprias idéias, sobre os
diversos problemas que surgem quando queremos conceitualizar, definir ou mesmo
entender o que é arte, belo, beleza etc. Recebia os textos antes da aula, os revisava,
selecionava e os lia para o resto dos estudantes. Dessa forma motivava novas
discussões, objeções, réplicas e tréplicas, sempre num nível elevado e
respeitoso — o que verdadeiramente é fazer filosofia. O nível dos textos motivou
a iniciativa de um dos estudantes, vindo da área de computação, de pôr esses
textos numa página na internet. Recebi feliz a ideia e assim foi feito. Isso ocorreu no primeiro semestre. Um dos
estudantes que mais se destacou foi o que terminou escrevendo mais textos.
Naquela página podemos ver estudantes que enviaram três. O estudante a que me
refiro enviou cinco.
terça-feira, 3 de julho de 2018
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